A INFLUÊNCIA DA ORALIDADE DA CRIANÇA NA
AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM ESCRITA
Rúbia
Gutstein1
RESUMO
O presente
artigo relata questões da Linguística, área de conhecimento que estuda as linguagens.
Neste caso, a ênfase é dada a linguagem escrita e as relações sociais que a
permeiam. Procura mostrar o papel da fala da criança no processo de aquisição
do sistema escrito e suas influências na produção textual das mesmas. De forma
sucinta, aborda a linguagem oral baseando-se nos Parâmetros Curriculares
Nacionais de Língua Portuguesa. Também tem como objetivo sinalizar o professor
como personagem de extrema importância na aquisição deste conhecimento. Onde,
aliando suas habilidades e práticas pedagógicas adequadas as diferentes
situações encontra-se resultados positivos ao decorrer do processo. E
finalizando traz a tona algumas das responsabilidades da escola durante todo o
processo de ensino-aprendizagem da escrita, bem como, as interferências positivas
que a escola, como instituição social presente na vida da criança, pode e deve
fazer.
Palavra-chave: Escrita, aquisição da escrita, práticas pedagógicas, escola.
1 INTRODUÇÃO
O crescimento dos estudos na área da linguística
alcançou ênfase no século XX com o intuito de transformar a língua em objeto de
estudo. Em constante prática, a Linguística vem se desenvolvendo e mostrando a
importância de seus estudos nos dias de hoje. Apontamentos feitos pela
Linguística moderna têm possibilitado a compreensão da linguagem no seu sentido
vivo e as influências que tem na interação dos indivíduos, visto que a
linguagem é um importante instrumento de comunicação.
Para a compreensão adequada dos processos que envolvem a linguagem é
preciso saber que ela passa por modificações ao decorrer do tempo e é
influenciada por fatores sociais. Fatores como idade, sexo, profissão, raça,
condição socioeconômica, e outros. Esses fatores dão origem as diversas formas
de expressão, com destaque aqui para as linguagem oral e escrita.
A diversidade linguística expressiva é decorrente a mudanças acontecidas
ao longo do tempo nos diversos grupos sociais. A escola, uma instituição
social, também participa desse processo com o papel de ressaltar a importância
do conhecimento das várias maneiras de expressão de seus alunos para que não
haja pré-julgamentos de seus dialetos. Assim, nota-se que não é atribuído à
escola o direito de assinalar o certo ou o errado na maneira de falar dos
indivíduos, e sim proporcionar a construção de conhecimento através da troca de
culturas vivida entre os alunos. Portanto a escola deve apresentar a forma
normativa instituída atualmente, mas jamais rejeitar alguma forma de
comunicação.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 A LINGUAGEM ORAL
A linguagem oral é um dos principais instrumentos de
comunicação da vida humana. Por meio dela acontece a socialização, a aquisição
de conhecimentos e experiências, bem como, a inserção e a participação do
sujeito na vida em sociedade. Como prova disto, pode-se observar a criança nos
primeiros anos de vida, onde através de balbucios acompanhados de gestos tentam
se comunicar com os que estão a sua volta. Dessa forma, e progressivamente, ela
vai adquirindo vocabulário para a explicitação de suas ideias e vontades com
mais nitidez.
Expressar-se oralmente é uma ação que exige segurança em si mesmo. De
acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (2000,
p.49)
Isso se conquista em ambientes favoráveis à
manifestação do que se pensa, do que se sente, do que se é. Assim, o
desenvolvimento da capacidade de expressão oral do aluno depende
consideravelmente de a escola constituir-se num ambiente que respeite e acolha
a vez e a voz, a diferença e a diversidade.
Além
de segurança, para uma boa desenvoltura da oralidade, é necessário que haja
adequação as diferentes situações de comunicação. Por isso, deve-se observar
atentamente o assunto a ser tratado, o público alvo, a intenção do discurso e a
formalidade que se deve obter para tal comunicação. Função cabível a escola,
visto que é a instituição social presente na fase de aprendizagem da criança
(PCN, p.49 e 50).
A linguagem oral deve ser intitulada como conteúdo a ser trabalhado de
forma contextualizada no dia a dia das escolas. Não somente na disciplina de
Língua Portuguesa, mas também deve passar por todas as outras áreas de
conhecimento. “Não basta deixar que as crianças falem; apenas o falar cotidiano
e a exposição ao falar alheio não garantem a aprendizagem necessária.” (PCN,
p.50) Portanto, é fundamental que haja planejamento pedagógico, afim de
promover atividades de fala. Assim, sendo a linguagem oral trabalhada de forma
significativa, beneficiará futuramente a produção textual dos alunos. (KOCH,
1997).
2.2 A LINGUAGEM ESCRITA
A linguagem escrita, conhecida e utilizada hoje, é
resultado de uma evolução de um sistema de comunicação muito antigo. Os
primeiros homens que se utilizaram dele registraram seus símbolos em paredes e
tábuas. Esses símbolos iniciaram-se com desenhos que visavam a representação de
coisas e conceitos. Mais tarde, os pictogramas deram lugar aos símbolos
fonéticos, ou seja, aqueles que representavam sons ao invés de ideias e coisas.
A partir daí, foram surgindo os primeiros alfabetos até chegarem ao sistema atual.
(SOUSA - sd)
Nos séculos passados o surgimento da linguagem escrita beneficiou
principalmente a economia das civilizações primitivas. Hoje, além de seus usos
na contabilidade de todo o mundo, ela, assim como a linguagem oral, também tem
a função de comunicar algo a alguém. Pode ser usada ora a serviço da
explicitação de uma ideia, ora na omissão e mascaramento da uma verdade possibilitando
o entendimento entre os homens. (COLELLO, 2012, P. 15)
A aquisição da linguagem escrita acontece pelo que chama-se de
alfabetização. No que se refere ao processo alfabetizador, Soares (2001, p. 61)
afirma a partir dos anos 80, com o estudo das ciências linguísticas a língua
materna, surgem novas concepção de aprendizagem e agora,
o conceito de sujeito aprendiz da escrita - não mais
um sujeito que aprende a escrever por imitação, por repetição, por associação, copiando
e reproduzindo letras, sílabas, palavras, frases, mas um sujeito que aprende
atuando com e sobrea língua escrita, buscando compreender o sistema, levantando
hipóteses sobre ele, com base na suposição de regularidades nele, submetendo a prova
essas hipóteses e supostas regularidades. Altera-se, assim, radicalmente, a
orientação do processo de aprendizagem e o significado das dificuldades
enfrentadas pela criança nesse processo.
Algo que também merece atenção no decorrer desse processo são
as dificuldades encontradas pela criança. Anteriormente, essas dificuldades
eram vistas como erros que precisavam ser corrigidos. Na nova concepção de
aquisição do conhecimento da escrita, os “erros” são considerados sinalizadores
para o professor. Com base em tais indicadores, o professor deve identificar as
falhas e posteriormente, se necessário, adequar a condução do processo de
construção da escrita. Essa condução pedagógica deve possibilitar ao aluno
atividades de escrita espontânea. Pois, “é só através da análise dos textos
espontâneos produzidos pela criança que a professora poderá identificar em que
estágio do processo de apropriação do sistema ela se encontra,...” (SOARES,
2012, p. 62).
A produção textual
espontânea é aquela que não necessita que a criança já tenha aprendido a
escrever para que escreva. Mas é escrevendo que ela aprenderá a escrever. “A
criança aprende a escrever agindo e interagindo com a língua escrita, experimentando escrever, ousando escrever, fazendo uso
de seus conhecimentos prévios sobre a escrita...” (SOARES, 2012, p. 61). Em
contra partida, a escrita controlada, onde o aluno colocará no papel somente
palavras que já aprendeu, mascara os erros e engana o pensamento de uma falsa
aquisição de escrita. Neste caso, o escritor colocará em prática somente
palavras e frases já conhecidas, treinadas, repetidas e copiadas, advindas de
cartilhas e do quadro da sala de aula sendo essa apenas uma expressão escrita.
(SOARES, 2012, p.62)
Ainda sobre as práticas de
produção textual, observa-se que este trabalho tem como objetivo principal
formar escritores capazes de produzirem textos eficazes ao propósito do mesmo.
Apropriando-se do PCN (2000, p. 65) que diz que,
Um escritor competente
é alguém que, ao produzir um discurso, conhecendo possibilidades que estão
postas culturalmente, sabe selecionar o gênero no qual seu discurso se
realizará escolhendo aquele que for apropriado a seus objetivos e à
circunstância enunciativa em questão.
Porém, para que isso ocorra o
aluno precisa ter acesso ao conhecimento da diversidade de gêneros existentes e
circulantes na sociedade. Por isso, a escola deve dispor, em suas práticas
pedagógicas, diversos textos que contribuam para a percepção e escolha correta do gênero no
momento da produção textual.
2.3 A RELAÇÃO DA LINGUAGEM ORAL E
DA LINGUAGEM ESCRITA
Como exposto aqui, a linguagem é combustível para a
comunicação. É a partir dela que ocorre a interação entre os sujeitos. Também é
pela linguagem que o homem ocupa e produz seu lugar na sociedade, podendo
usa-la para condená-lo ou liberta-lo. (BOZZA, 2008, p.17)
Fala e escrita são duas variantes
do uso da língua. Cada uma delas possui suas características específicas,
embora se utilizem do mesmo sistema linguístico. Isto não significa que elas
devem ser vistas separadas, pelo contrário, “a escrita transforma a fala e a
fala influencia a escrita”. (PCN, 2000, p.52)
Fala e escrita apresentam complexidades diferentes. O que se comprova é
que existem textos próximos a fala convencional, à medida que existem falas
próximas a escrita formal. (KOCH, 1997, p.32) Nesse sentido, passa-se a
observar as interferências que o modelo de fala já construído pela criança
produz na aquisição da escrita da mesma.
Em uma série de textos escritos por alunos de primeiro a quarto ano
pode-se encontrar vários elementos característicos do discurso falado. Como por
exemplo, a repetição, talvez a característica mais comum entre os textos.
Ocorrente com grande frequência entre eles. Elas podem ser eliminadas do texto
sem bagunçar o sentido do mesmo. São resultantes do emprego do modelo fala
construído pela criança. (KOCH, 1997, p.35)
Vale lembrar que o professor deve apresentar aos alunos a diferenciação
das linguagens oral e escrita. Para que o aluno, em fase de aquisição da
escrita, possa perceber que o texto escrito difere do discurso usado na
interação face-a-face. Ou seja, aluno precisa dar conta de perceber que “a
escrita não é o espelho da fala” como afirma o PCN (2000, p. 66).
Neste sentido, o trabalho desenvolvido pelo professor para que a criança
se aproprie da linguagem escrita de forma significativa e não decodificativa
necessita dar
Acesso à diversidade de textos escritos, testemunhar a
utilização que se faz da escrita em diferentes circunstâncias, defrontar-se com
as reais questões que a escrita coloca a quem se propõe produzi-la, arriscar-se
a fazer como consegue e receber ajuda de quem já sabe escrever. (PCN, 2000, p.
67)
Então, o professor deve ser cauteloso com relação à escrita para não
intimidar ou afastar o aluno do que se pretende. “É preciso aproxima-los,
principalmente quando são iniciados “oficialmente” no mundo da escrita por meio
da alfabetização.” (PCN, 2000, p. 67). Afinal, esta é somente o início da
caminhada que deverão trilhar pelo resto da vida.
2.4 O PAPEL DO PROFESSOR NA
AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM ESCRITA
Sabe-se que para a aquisição de qualquer conhecimento
do aluno é necessário analisar uma série de fatores. Leva-se em consideração as
capacidades cognitivas de cada indivíduo, bem como, as habilidades do professor
na transmissão de tal conhecimento. (SOARES, 2001, p.74)
Como afirma Colello (2012, p. 26), “No contexto de nossa sociedade,
alfabetizar é também dar voz ao sujeito”. Sendo assim, o professor deve
promover práticas pedagógicas que possibilitem ao aluno o surgimento e
aperfeiçoamento de uma voz ativa. Pois, essa será a voz que fará parte das
práticas sociais.
2.5 A RESPONSABILIDADE DA ESCOLA
AOS SABERES LINGUÍSTICOS
Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais de
Língua Portuguesa a escola tem a função e responsabilidade de garantir o acesso
aos saberes linguísticos. Os saberes que envolvem esta área do conhecimento tem
estreita relação com o exercício da cidadania. Pois, é por meio deles que o
homem se comunica, tem acesso à informação, expressa e defende pontos de vista,
produz conhecimento. (PCN, 2000, p. 23)
Essa responsabilidade torna-se maior quando se entende que cada aluno
deve tornar-se capaz de interpretar e produzir diferentes textos em diversas
situações.
Dessa perspectiva, a língua é um sistema de signos
históricos e social que possibilita ao homem significar o mundo e a realidade.
Assim, aprendê-la é aprender não só as palavras, mas também os seus significados
culturais e, com eles, os modos pelos quais as pessoas do seu meio social
entendem e interpretam a realidade e a si mesmas. (PCN, 2000, P.24)
Sabendo
dessas funções sociais, pode-se dizer, através de Colello, que entre todas as
conquistas do homem a linguagem é a que mais contribui para fazer dele um ser
humano de fato.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não é de hoje que linguistas e profissionais dessa
área de conhecimento estudam a história da linguagem juntamente com suas transformações
ao longo do tempo e as suas influências no trabalho pedagógico dos professores.
Com isso, constatou-se aqui a importância de práticas pedagógicas que
proporcionem uma adequada aquisição das linguagens oral e escrita. Com ênfase
na linguagem escrita, destacou-se também a responsabilidade da escola, como
instituição social presente na vida das crianças.
Fazer com que se compreenda que o discurso escrito deve adequar-se ao
gênero que se exibirá, que deve ser coerente apresentando de forma clara seus
objetivos e, sobretudo que deve ser planejado pensando no leitor final já é uma
conquista para quem ensina e aprende.
Absorver que fala e escrita são modalidades da língua, mas que cada qual
tem suas próprias características também é de extrema importância para a
produção textual da criança. Que em fase de aquisição do sistema da escrita por
meio da alfabetização tende a trazer elementos característicos da fala para a
produção escrita.
Portanto, o aluno, integrante de uma sociedade e conferido de papeis
sociais, precisa ter os conhecimentos a cerca das linguagens. Para que, mais
tarde, nas suas contribuições e exercício da cidadania possa ser feito da
melhor forma possível.
REFERÊNCIAS
BOZZA, Sandra. Ensinar a ler e a
escrever: uma possibilidade de inclusão social. Pinhais: Editora Melo,
2008.
BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: língua portuguesa/ Secretaria
de Educação Fundamental. 2.ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2000.
COLELLO, Silvia
M. Gasparian. A escola que (não) ensina
a escrever. 2.ed. São Paulo: Summus, 2012.
DALMÔNICO, Vilde
Luzia; FERREIRA, Reginaldo José; PEZZI, Marcelo Rodrigo. Guia Para Apresentação de Trabalhos Acadêmico. Joinville, 2013.
KOCH, Ingedore
G. Villaça. Interferência da oralidade
na aquisição da escrita. 1997. Disponível em: http://revistas.iel.unicamp.br/index.php/tla/article/view/2430. Acesso em: 30 out. 2015.
SOARES, Magda
Becker. Aprender a escrever, ensinar a
escrever. 2001.Disponível em: http://www.crmariocovas.sp.gov.br/pdf/ideias_28_p059-075_c.pdf
. Acesso em: 30 out. 2015.
SOUSA, Rainer Golçalves. A origem
da escrita. Disponível em: http://www.mundoeducacao.com/historiageral/origem-escrita.htm.
Acesso em: 28 out. 2015.
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